Airoso
Apesar do céu de chumbo, não há razão para não abrir as pálpebras, abandonar o calor uterino da palha, acender o lume e prepara a casa para os dias de sol, que não podem tardar.Os Cíclades há muito estão em flor, embora ninguém tenha ainda ouvido cantar o cuco. Quando demoro os olhos naquelas pétalas, prestes a voar, penso que mereciam ser postas num poema. Mas a poesia é o inferno, e bem sabemos como são estreitas as suas portas. Hoje dará abrigo a um adolescente que a chuva trouxe, de crina fulva e olhos de animal de outra estrela, onde em surdina canta o deserto. Com ele, finalmente, o sol faz a sua aparição
Vertentes do olhar(Eugénio de Andrade)